top of page

Maternidade em Questão

26.05.2021

Maternidade solo: a culpa não é sua, mas a sobrecarga é!

Mádhava Hari

Fui mãe aos 19 anos de idade e mesmo na época, meu companheiro desejando ser pai, quando optei pela separação, ainda na gravidez, ele resolveu se abster das responsabilidades em relação à paternidade. Meu primogênito é registrado apenas no meu nome.
 

Passados oito anos, engravidei novamente e apesar de ter companheiro durante toda a gestação, foi o período mais perturbado, exaustivo e solitário, mesmo ‘estando’ acompanhada. Com 4 meses da minha filha nascida, optei pela separação. As responsabilidades que já não eram compartilhadas quando estávamos juntos, se transformou em total ausência afetiva seja sobre as questões materiais.
 

Em um novo relacionamento, grávida da terceira filha que era a primeira filha do meu relacionamento e que ele dizia desejar muito ser pai. Novamente opto pela separação ainda na gravidez, após descobrir que ele estava se relacionando com uma outra pessoa. Certamente durante a maternidade fica evidente demais a desigualdade de gênero.

Nos três períodos e circunstâncias, nunca foi uma escolha minha que os pais se ausentassem do convívio dos filhes. Eu optei pela separação. E eles pela ausência com as crianças. Uma decisão totalmente unilateral deles, bem como nunca promoveram nenhum tipo de compensação por me deixarem com toda responsabilidade afetiva e material. Nas questões materiais consegui que assumissem suas responsabilidades judicialmente.
 

No entanto, no que se refere às responsabilidades afetivas, educacionais, etc, nunca consegui a participação, nem a divisão dessas responsabilidades. Sempre estive sobrecarregada com a carga dos outros, neste caso, dos pais.

Durante todo meu percurso escutei por diversas vezes e de diversas pessoas discursos que me responsabilizavam pela ação alheia, já não era suficiente eu estar sobrecarregada com as responsabilidades alheias.

“Homem é assim mesmo.” Ou seja, minha condição de mulher é para assumir mesmo os cuidados com as crianças. Como se fosse destinada a isto.
 

“Ele tem que trabalhar” para justificar a ausência. Eu também tenho que trabalhar e ainda assim articular minha vida e trabalho, de modo a ser presente na vida dos meus filhos. Passei anos não trabalhando à noite, para poder estar com meus filhos e dar conta de suas demandas. Rejeitei cargos, aumento de renda, estudos e etc. para dar conta das demandas, que se fossem compartilhadas, eu não precisaria me anular.
 

“Você não sabia que ele era assim?” A bola de cristal que eu não tenho e a leitura da testa que eu não faço. Precisamos aceitar o aspecto da formação cultural. À paternidade não é exigida tantas responsabilidades, anulações e dedicação exclusiva tanto quanto é exigida da maternidade. Sendo assim esbarrar com um homem que fuja da formação cultural ao qual está incluído e que é algo bem incomum.
 

“Talvez um dia ele amadureça.” E eu tenho que esperar é?! A criança tem que esperar?! Ora minha maternidade foi se construindo na força das necessidades, enquanto lutava pela sobrevivência. Por que aos homens é dado o “tempo de amadurecer''? Quando estiverem bem psicologicamente, materialmente, etc.

Compreender a construção social dos papéis foi libertador para que pudesse me livrar da culpabilização que a sociedade me colocava durante anos, através de discursos. Entender que estou sobrecarregada sim, mas que não é minha culpa, que não sou responsável pelas ações alheias.
 

Quando eu consegui compreender que a minha história não é apenas sobre mim, tendo em vista que se repete com várias mulheres. Que enquanto a chave dessa compreensão não vira para nós, tudo tornar-se mais difícil. Mas para mim, virou e isso é liberta-DOR!

bottom of page