Quando alguém me pergunta o que ler para pensar mães no doutorado o livro Maternidade e Carreira: Reflexões acadêmicas na fase do Doutorado de Silvana Maria Bittencourt (professora da UFMT) é definitivamente o primeiro que me vem à memória. Neste livro, que é fruto de sua tese de doutorado, a autora se propõe a analisar as experiências de mães doutorandas ponderando especialmente sobre a área de exatas, onde percebe-se grandíssimas assimetrias de gênero.

A autora enfatiza como o ambiente acadêmico se constitui em um ambiente de grandes cobranças de produtividade que, ao se misturar com a rotina de mãe, esposa e dona de casa, cria uma necessidade de construir táticas para lidar com suas vidas pessoais e acadêmicas/profissionais. 

Como a tese que dá origem ao livro é escrita antes da promulgação da lei de 2017 que dá direito a dilatação de prazos regulamentares para as mães bolsistas de pós-graduação, Silvana apresenta as resoluções disponíveis na época e a trajetória da consolidação dos primeiros direitos das mães universitárias. A autora capta rotinas riquíssimas de mães no doutorado, demonstrando como a escassez de direitos legitimada pela própria instituição impõe desafios maiores para doutorandas que também são mães.

Deitado eternamente no berço do jargão “oportunidades iguais para todos”, o discurso meritocrático que impera na academia reflete em uma grande desvantagem para aquelas que precisam também dar conta das rotinas domésticas e da maternidade. Acrescento que em alguns casos existam além destas, as rotinas laborais, tendo em vista os cortes nas bolsas de pós-graduação no país.

A autora aponta como a dificuldade de produzir não está apenas na constante necessidade de gestão do tempo, mas também na dificuldade em consolidar parcerias de publicações e produção do capital científico. Capital este que fortalece o currículo lattes e é indispensável para aprovação de projetos, aquisição de bolsas, aprovação em concursos docentes e progressão de carreira.

Além das discussões sobre as instituições de ensino e pesquisa, a autora demonstra também como a centralidade das atividades de cuidado na figura da mãe precisa ser derrubada dentro da família. Com abundantes relatos de que o companheiro “ajuda”, as mães entrevistadas por Bittencourt demonstram o quão exaustivo é estar nessa posição tendo que mobilizar uma rede de cuidado para garantir a conclusão dessa etapa formativa.

Como um dos principais livros que utilizei na minha própria dissertação de mestrado e uma das minhas autoras prediletas, considero a produção de Silvana Bittencourt um ouro pra quem quer pensar sobre a feminilização do cuidado e sobre o resultado do atravessamento dessas práticas com as rotinas femininas, em especial com as rotinas profissionais.

 

Referência: BITTENCOURT, Silvana. Maternidade e carreira: reflexões de acadêmicas na fase de doutorado. Jundiaí: Paco, 2013.

 

Interessou? A biblioteca do NIEM conta com algumas publicações da autora que estão disponibilizadas gratuitamente.