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Autora-Data

30.02.2021

Contra os filhos?

 Livro de Lina Meruane traz críticas ácidas sobre a maternidade e o feminismo

Juliana Márcia

Dando início a abordagem de livros “não tão acadêmicos” peço licença para apresentar o provocativo livro Contra os filhos: uma diatribe (2019) da professora chilena Lina Meruane. O subtítulo “uma diatribe” denuncia o tipo de abordagem que a autora escolhe, pois segundo o dicionário Aulete a palavra significa “Crítica amarga e áspera”. Sendo assim, em uma crítica ácida e necessária a autora escolhe abordar temas do século XXI, trazendo uma análise de movimentos recentes e discursos que podem parecer bastante progressistas, mas só parecem.
 

Tratando não só da pressão social sobre a mãe pela perfeição, mas também às não-mães e às ainda-não-mães ou ainda-sem-filhos (categoria na qual essa pesquisadora aqui se insere) a autora afirma que acredita que a questão dos filhos não prosperou. Um dos pontos importantes do livro é quando, em poucas palavras a autora aponta como em 1970 o termo “childless” (sem filhos), que era usado para determinar as mulheres que não podiam ter filhos, deu lugar ao termo “childfree” (livre-de-filhos) demonstrando o poder de decisão das mulheres a dizer que não tem filhos por opção. Vale destacar que utilizando desta liberdade de escolha o movimento childfree nos últimos anos tem se tornado um movimento de ódio a crianças que JAMAIS deve ser tolerado.
 

Ao avançar em sua discussão, Lina Meruane aborda como alguns discursos de feminismos maternalistas, ecológicos e essencialistas, retomam discursos de valorização da maternidade natural/ecológica recomendando prolongamento do tempo de lactação, a convivência intensa com os filhos (ignorando as suas necessidades individuais), que não usem fraldas descartáveis ou mamadeiras, além de uma enorme lista de obrigações que caso sejam cumpridas podem sobrecarregar novamente a mulher mãe que já vive em um malabarismo para dar conta de suas múltiplas jornadas. 

Embora a crítica ácida de Lina seja muito necessária, na minha perspectiva pessoal, acredito que em alguns momentos esse ácido respinga e queima algumas mães que são verdadeiramente as vítimas do sistema maternalista imposto pela sociedade, tanto por setores conservadores quanto os mais progressistas, que muitas vezes ao tentar valorizar a maternidade acabam retomando os mesmos discursos biologizantes que criaram o mito do amor materno. Por outro lado o movimento “NoMo” (no mothers – não mães), onde alguns afirmam que este livro se insere, nos instiga a refletir sobre essas novas formas de maternidade e não-maternidade que surgem ou apenas se renovam em nossa sociedade e até mesmo sobre os novos problemas que a conjuntura atual coloca.
 

O conteúdo apresentado pela autora é mais do que recomendado para refletirmos sobre a discussão sobre a maternidade na esfera política, tendo em vista que alguns países da américa latina, incluindo o Brasil, tem enfrentado uma polarização que atinge diversas esferas da vida cotidiana e que a maternidade tende a ser um tema caríssimo para as mulheres, especialmente aquelas que dependem das políticas públicas.

Juliana Márcia
Colunista
Bahia - Brasil

Área de formação: Serviço social (Graduação), Mulheres, gênero e feminismos (mestrado), Serviço Social (Doutorado)

Principais pesquisas ( caso tenha): maternidade e carreira, maternidade e formação, gênero e universidade, gênero nas ciências, assistência estudantil para mães e relações raciais na Universidade

Coletivos, gts, ong ou organizações que participam: Pesquisadora do Núcleo Interseccional de Estudos Sobre a Maternidade - NIEM, do grupo de pesquisa Ciência, gênero e educação - CIGE e do Grupo de Pesquisa de Ações Afirmativas e Reconhecimento - GPAAR.

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