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Edição Especial NIEM

29.09.2021

Maternidade e a revisão dos papéis sociais

EDIÇÃO ESPECIAL - NIEM

Maternidade e a revisão dos papéis sociais

Karla Maria
Mestra em Sociologia /Estudante de Pedagogia.
Articuladora na Coletiva Pachamama
Mãe de João e Cauê.

Coletivo de Mães
Pachamamá

O cuidado, o amor incondicional e a entrega total das mulheres mães aos filhos/as é amplamente difundido por todo o mês de maio, o mês simbólica que representa a maternidade, mas temas sobre livre escolha da maternidade e trabalho não pago e pago, que traz a tona desigualdade salarial entre homens e mulheres, carga dupla ou tripla de trabalho, além dos prejuízos que a mulher sofre quando se torna mãe e corre risco de perder seu emprego são alguns dos temas que não são amplamente discutidos pela sociedade.

 

No debate acerca da maternidade, a condição da mulher mãe na sociedade vem desenrolar uma trama em que a opressão se perpetua, visto que a formação da família e a condição da mulher na sociedade legitimam, mais que o determinismo biológico, a desigualdade entre os gêneros. Ao longo do processo histórico do feminismo, alguns pontos foram postos em discussão na sociedade pelo movimento, a questão da família, dos direitos reprodutivos e da sexualidade da mulher. A maternidade foi, em determinado momento da história, encarado como fator principal da dominação do homem sobre a mulher e  posteriormente, encarada como fator diferencial do ser mulher, sendo guiado pelo feminismo diferencialista, onde se valorizava as diferenças do ser mulher em relação ao outro gênero.

 

O movimento feminista é o meio por qual as mães se engajaram para levarem suas pautas em conjunto com as pautas dos movimentos de mulheres e feministas. Foi através dos movimentos organizados pelas mulheres feministas que as pautas como método anticoncepcional, aborto, amamentação e maternidade livre dentre outros, foram pautadas na política e na sociedade.

 

O que se destaca dessa relação do feminismo e a maternagem é uma relação conflituosa, onde se vê relatos de ocultação das demandas maternas dianted da pauta do feminismo. Assim como diversas vertentes surgiram do feminismo liberal, que não dava conta da diversidade de demandas, a maternagem é mais um recorte que pretende se fixar no feminismo moderno para enfatizar suas demandas em meio a tantas do feminismo. Com a terceira onda do feminismo, muitos movimentos de mulheres se lançaram nas redes sociais para discutirem suas pautas e ampliar seu espaço de discussão.

A partir do contexto de liberação da prática da contracepção e a sexualidade da mulher, por volta dos anos de 1970, considerado "Um marco da passagem do feminismo igualistarista para a fase do feminismo 'centrado na mulher-sujeito', dando os elementos necessários para a politização das questões privadas, que eclodiram com o feminismo contemporâneo "(SCAVONE, 2001,p. 138) e a questão do gênero sendo discutida, o movimento feminista ressalta a questão da desconstrução do determinismo biológico para explicar a opressão sofrida pela mulher na sociedade. É relevante analisar as ações da maternagem no feminismo e na desconstrução dos papeis sociais ancorados na desigualdade de gênero, diante de um movimento tão amplo e diversificado, por vezes, conflituoso em relação às múltiplas vertentes e suas gamas de pautas a serem postas em debate.

 

Esse novo corpo político atuante na sociedade civil, traz para debate público o direito da maternidade e da criança livres, com direitos e deveres, porém, nem o movimento feminista nem o Estado estão dando conta de acolher as pautas e cumprir com as garantias dos direitos das mulheres mães e das crianças.

O maternar enquanto ato político, faz parte da reprodução da mão de obra, é preciso se ater a função da maternidade como fator fundamental para uma nova configuração social, pois o maternar é criar vidas, sujeitos, indivíduos sociais, logo, maternar deve ser compreendido como ato político e que se estende ao espaço público também.

 

Dessa forma, o movimento de mães se torna mais atuante no campo dos movimentos sociais, sendo parte de um movimento maior que é o feminismo e que está presente não só em atos/eventos físicos, mas também no mundo digital. A maternidade passa a ser analisada como um fenômeno social, que engloba as relações de gênero (e a luta pela desconstrução da dominação existente nessa relação) e como um novo ativismo dentro dos movimentos sociais e do feminismo, mais precisamente.

 

A maternidade é, então, percebida como uma construção social, trazendo para debate o rompimento dos papéis sociais que subjuga as mães a um enclausuramento social, do espaço público e político. A atuação política da maternidade traz a necessidade de romper com essa estrutura hierárquica. E para além de um debate sobre remuneração do trabalho doméstico, é preciso rever as posições sociais que levam as mulheres ao papel exclusivo do cuidado do lar e dos/as filhos/as, para que não reforcemos o pertencimento a este lugar. Não tirando a grande conquista que é o reconhecimento do trabalho doméstico realizado por mães, mas que esse fato não nos leve ao conformismo do papel que nos é designado no sistema patriarcal. 

 

Como afirma LEMES (2018), quando diz que, “a capacidade de resistir a tais padrões sexistas e reconstruir relações de gênero mais igualitária na família exige a reinterpretação do trabalho doméstico” (p.152), que tem em sua base estrutural, uma hierarquização de gênero e papeis sociais. Dessa forma, uma análise se faz necessário, visto que estamos diante de um novo movimento social e político que propõe ações que ampliam os direitos civis das mulheres mães, pais e das crianças, englobando toda a rede de apoio fundamental para que se exerça a democracia e responsabilização do Estado para uma sociedade mais igualitária entre os gêneros.

 

No cenário pandêmico entre 2020 e 2021, esses movimentos de mulheres mães ampliaram sua atuação nesse novo espaço de ativismo político. Muitos foram os grupos em mídias sociais que iniciaram suas atividades para dar um suporte online às diversas realidades das mães brasileiras. Foram as mães, as que mais sofreram com os impactos da pandemia, tendo que procurar meios de sobrevivência para si e seus filhos/as, assim como as que mais englobam o numero de profissionais na linha de frente ao combate ao covid-19 no país. Mais uma vez, as ações das mães nos mostra que são ações políticas, de enfrentamento às desigualdades sociais e de gênero, assim como de raça.

 

Não podemos esquecer que a maternidade é a base para a formação de sujeitos sociais, que são as mães as que sustentam, de fato, toda a nação, que edifica o futuro. Não esqueçamos das mães pretas e periféricas, das mães lésbicas, das mães encarceradas e de tantas outras que têm sua realidade ocultada. A mãe pari um/a filho/a sozinha, mas a criação é responsabilidade dela e toda a sociedade.

 

 

Referências Bibliográficas:

 

LEMES, Luana Borges. Novas práticas de maternagem e feminismo das mulheres da plataforma Cientista Que Virou Mãe. Dissertação (Mestrado). 2018.

 

SCAVONE, Lucila. A maternidade o feminismo: diálogo com as ciências sociais. Cadernos Pagu (16)2001: pp. 137-150.

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A Coletiva de Mães Pachamamá é uma organização sem fins lucrativos que tem foco na militancia materna, rede de apoio  no empoderamento materno e na infância livre. 

Karla Maria é ativista da Coletiva Pachamamá, mãe de João e Caue e Mestra em Sociologia.

Conheça a Coletiva Pachamamá em sua IG @coletiva_pachamama.

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